Medicamentos que prolongam o intervalo QT: um risco silencioso para o coração
- praticenfgp
- 15 de set.
- 3 min de leitura
O intervalo QT no eletrocardiograma (ECG) representa o tempo entre o início da despolarização ventricular e o fim da repolarização. Em termos práticos, é o tempo que o ventrículo leva para se preparar para um novo batimento.
Quando esse intervalo é prolongado, o risco de arritmias ventriculares perigosas, como a Torsades de Pointes, aumenta consideravelmente — podendo evoluir para fibrilação ventricular e morte súbita.
O que muitos profissionais subestimam é que diversos medicamentos de uso comum podem causar esse prolongamento ao longo do tempo, especialmente quando combinados, em doses acumulativas, ou usados em pacientes com comorbidades cardíacas e distúrbios eletrolíticos.
Neste artigo, vamos entender:
· O que é o prolongamento do intervalo QT
· Quais classes de medicamentos estão envolvidas
· Por que o risco é progressivo e acumulativo
· Como prevenir eventos adversos
O que significa prolongamento do intervalo QT?
O intervalo QT corrigido (QTc) é um dos parâmetros mais importantes da avaliação elétrica do coração. Ele é ajustado pela frequência cardíaca e, em geral, considera-se:
· Normal: QTc < 440 ms (homens) ou < 460 ms (mulheres)
· Limítrofe: QTc entre 440–500 ms
· Prolongado: QTc > 500 ms → risco elevado de arritmia
O prolongamento do QT pode ser congênito (Síndrome do QT Longo) ou adquirido, e o principal fator adquirido são medicações que interferem na repolarização cardíaca, bloqueando os canais de potássio (HERG).
Principais classes de medicamentos que prolongam o QT
1. Antiarrítmicos
· Amiodarona
· Sotalol
· Dofetilida
· Procainamida
· Quinidina
2. Antibióticos
· Macrolídeos (azitromicina, claritromicina, eritromicina)
· Fluoroquinolonas (levofloxacino, ciprofloxacino)
· Antifúngicos (fluconazol, voriconazol)
3. Antipsicóticos
· Haloperidol
· Ziprasidona
· Quetiapina
· Risperidona
4. Antidepressivos
· Citalopram (elevado risco em doses > 40 mg)
· Escitalopram
· Amitriptilina (tricíclicos)
· Fluoxetina
5. Antieméticos
· Ondansetrona
· Domperidona
· Metoclopramida (em altas doses ou uso prolongado)
6. Opioides e analgésicos
· Metadona (especialmente em uso crônico)
7. Outros
· Loperamida (doses elevadas)
· Tacrolimo
· Inibidores de tirosina-quinase (oncologia)
· Hidroxicloroquina (uso off-label na COVID-19 intensificou atenção ao QT)
Por que o risco aumenta com o tempo?
O prolongamento do QT por medicação nem sempre é imediato. O risco é progressivo e multifatorial, podendo se intensificar com:
· Acúmulo da droga no organismo (meia-vida longa)
· Polifarmácia (soma de fármacos com ação semelhante no canal HERG)
· Interações medicamentosas que inibem metabolismo (ex: inibidores do CYP3A4)
· Disfunções hepáticas ou renais (acúmulo da droga)
· Hipocalemia, hipomagnesemia, bradicardia — fatores que potencializam o efeito pró-arrítmico
· Idade avançada e cardiopatias pré-existentes
Em muitos casos, o paciente já usa um desses medicamentos cronicamente, e a adição de outro pode ser o “gatilho” para a arritmia.
Papel do enfermeiro na prática clínica
1. Reconhecer os medicamentos de risco
O enfermeiro que administra medicamentos com potencial de prolongar o QT precisa saber identificar esses fármacos, principalmente quando há associação com outros de efeito semelhante.
2. Monitorar eletrólitos e função renal
O enfermeiro deve acompanhar os exames laboratoriais de:
· Potássio (ideal > 4,0 mEq/L)
· Magnésio (ideal > 2,0 mg/dL)
· Creatinina e função hepática
Distúrbios nesses parâmetros aumentam significativamente o risco de arritmias induzidas por medicamentos.
3. Observar sinais clínicos precoces
Os sinais iniciais de toxicidade cardíaca podem ser sutis. Fique atento a:
· Palpitações
· Tontura ou pré-síncope
· Sudorese fria
· Queda da PA após administração de fármacos de risco
· Alterações no padrão do ECG (em pacientes monitorizados)
4. Solicitar ECG quando indicado
O enfermeiro pode sugerir ao médico a realização de um eletrocardiograma de controle quando:
· Há uso associado de fármacos com potencial para prolongar o QT
· O paciente apresenta fatores de risco (idade, IC, DRC)
· Sinais clínicos compatíveis com arritmia
5. Educar a equipe e o paciente
O enfermeiro pode orientar colegas e pacientes sobre:
· A importância de não associar medicamentos sem prescrição
· A necessidade de manter eletrólitos em níveis adequados
· Os sintomas que exigem avaliação imediata
6. Notificar e registrar
Ao identificar qualquer suspeita de reação adversa ou risco iminente:
· Notifique a equipe médica
· Registre no prontuário
· Se necessário, acione a farmacovigilância hospitalar
Conclusão
O prolongamento do intervalo QT não é apenas uma questão médica — é uma responsabilidade multiprofissional.
Na linha de frente, o enfermeiro atua como sensor clínico, sendo o primeiro a administrar, observar e reagir aos efeitos dos medicamentos. Conhecer os riscos, monitorar os sinais e se posicionar com conhecimento técnico é o que diferencia o profissional preparado do profissional passivo.
Atualize-se, observe, questione, oriente.O cuidado com o coração do paciente também passa por você.
Gostou dessa informação? Então compartilhe esse conteúdo com colegas e familiares. Informação confiável salva vidas!
Siga a gente no IG @praticaenfermagem para saber mais.
Conheça nossos cursos: https://www.praticaenfermagem.com/
Conheça nossa pós-graduação: https://praticaensino.com.br/
Comentários