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A História do Atendimento Pré-Hospitalar (APH): Da Carruagem de Guerra ao SAMU 192

O Atendimento Pré-Hospitalar (APH) é a assistência essencial prestada, direta ou indiretamente, fora do ambiente hospitalar. Este serviço busca chegar precocemente à vítima, prestando suporte médico e transporte adequado a um serviço de saúde, visando a manutenção da vida e a minimização de sequelas.


A história do APH é uma jornada de evolução contínua, impulsionada inicialmente por necessidades militares e, posteriormente, consolidada como uma política pública de saúde no Brasil.



As Raízes Históricas: Da Guerra ao Modelo Civil


Os pressupostos históricos do atendimento pré-hospitalar remontam ao século XVIII, ganhando forma nos campos de batalha:


  • Pioneirismo Francês: O Barão Dominik Jean Larrey, cirurgião militar de Napoleão, é creditado pelo pioneirismo ao prestar cuidados iniciais aos soldados feridos no campo de batalha, por volta de 1795. Larrey idealizou as "ambulâncias voadoras" — carroças rústicas puxadas por homens ou cavalos — para a remoção rápida dos feridos graves para "hospitais de campanha". O termo "ambulância" deriva da raiz francesa ambulant (que deambula).


  • Influência Militar: O atendimento aos soldados feridos levou à formação da Cruz Vermelha Internacional em 1863 e demonstrou a necessidade de atendimento rápido. Durante a Guerra do Vietnã (1969-1972), houve o desenvolvimento da hidratação venosa e o uso de helicópteros para remoção, precursores do transporte aeromédico atual. A experiência de guerra foi transposta para o meio civil, especialmente no atendimento a pacientes politraumatizados.


  • Modelos de APH Civil (EUA e França): 

    • Nos Estados Unidos, o conceito de cuidado médico de emergência nasceu por volta de 1940. Este modelo, centrado no paramédico e voltado principalmente para o Trauma, foi adotado inicialmente pelo Corpo de Bombeiros.

    • Na França, a regulação médica das urgências começou na década de 1960, culminando na criação do Service d’Aide Médicale Urgente (SAMU) em 1968. Este modelo é centrado no médico e visa aumentar as chances de sobrevivência com a participação médica no local.



O Pioneirismo Brasileiro: Antes do SAMU 192


No Brasil, o desenvolvimento do APH extra-hospitalar foi inicialmente desordenado e dependente de iniciativas isoladas, muitas vezes ligadas à segurança pública.


  • Iniciativas Iniciais: A primeira tentativa de estruturação de um APH ocorreu em 1893, no Rio de Janeiro, com a aprovação de uma lei para socorro médico de urgência na via pública. Em 1899, o Corpo de Bombeiros foi a primeira instituição a conduzir a ambulância (ainda de tração animal) para os chamados de urgência.


  • Década de 80 e 90: Os primeiros serviços organizados surgiram na década de 80, sem legislação federal, inspirados no modelo americano e, na maioria dos estados, ligados ao Corpo de Bombeiros Militar (CBM). Antes da regulamentação federal, o CBM representava a única alternativa de atenção pré-hospitalar em muitos estados.


  • Modelos Nacionais: 

    • SIATE (Curitiba, 1990): O Sistema Integrado de Atendimento ao Trauma e Emergências foi implantado em Curitiba, resultado de uma ação conjunta entre a Secretaria Estadual de Saúde e a Secretaria de Segurança Pública. Utilizava socorristas do CBM e médicos no sistema regulador. Este sistema serviu de modelo para a estruturação do APH nacional a partir de 1990.

    • Fortaleza (GSU e SOS Fortaleza): O Grupamento de Socorro de Urgência (GSU), pertencente ao CBM, iniciou o APH em 1989, voltado para o atendimento de trauma em via pública. Em 1992, o município criou o SOS Fortaleza, um serviço complementar voltado inicialmente para o atendimento domiciliar de urgências clínicas. O SOS Fortaleza, inclusive, foi nomeado para representar o Ceará na Cooperação Técnica Brasil-França na área da urgência em 1996.



A Consolidação da Política Nacional de Urgências


O grande marco para a organização do APH no Brasil veio com a sua vinculação formal ao Sistema Único de Saúde (SUS) no início dos anos 2000.


  • Regulamentação Técnica (2002): A Portaria nº 2.048/2002 aprovou o Regulamento Técnico dos Sistemas Estaduais de Urgência e Emergência, vinculando o APH ao SUS e estabelecendo as diretrizes para a organização estrutural e funcional, incluindo a necessidade de Centrais de Regulação.


  • PNAU e SAMU 192 (2003): A Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU) foi instituída pela Portaria nº 1.863/2003, visando estruturar uma rede regionalizada e hierarquizada. No mesmo ano, a Portaria nº 1.864/2003 instituiu o componente pré-hospitalar móvel, dando origem ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192) em todo o território nacional, como primeira etapa da implantação da PNAU.


  • Modelo Híbrido e Centralidade: O SAMU 192 é um modelo híbrido, mesclando os sistemas francês (medicalizado) e americano (técnico). Seu centro é a Central de Regulação das Urgências (CRU), que garante o acolhimento.


  • Acesso Nacional: Em 2004, o Decreto nº 5.055/2004 garantiu o acesso nacional gratuito pelo número telefônico único 192. O médico regulador na CRU é o ator principal, responsável por julgar, decidir sobre a gravidade e definir a resposta mais adequada à solicitação (que pode ser desde um conselho médico até o envio de uma ambulância de Suporte Básico ou Avançado).


  • Expansão e Inovações: A partir de 2004, a implantação do SAMU tornou-se expressiva. Em 2008, a Motolância foi instituída como integrante da frota de intervenção do SAMU, buscando chegar rapidamente ao cidadão. O serviço aeromédico do SAMU Ceará, por exemplo, é um avanço que conta com helicópteros.



A RUE e o Cuidado em Rede


O APH móvel não é um serviço isolado, mas um componente vital da estrutura de saúde brasileira, evoluindo para um sistema em rede.


  • Rede de Atenção às Urgências (RUE): Em 2011, a Portaria nº 1.600/2011 reformulou a PNAU e instituiu a Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE). O objetivo da RUE é articular e integrar todos os serviços de saúde (Atenção Básica, SAMU 192, UPAs e hospitais) para ampliar e qualificar o acesso humanizado de forma ágil e oportuna.


  • ACCR como Guia: O Acolhimento com Classificação de Risco (ACCR) é o guia orientador da RUE, começando já na regulação médica. O ACCR, proposto pelo Ministério da Saúde, busca priorizar os pacientes consoante a gravidade clínica, abandonando a lógica do atendimento por ordem de chegada.


  • Regulação como Ordenadora: O SAMU 192 e suas Centrais de Regulação atuam como o ordenador dos fluxos assistenciais, garantindo que o atendimento referenciado (em rede) ocorra da maneira mais eficaz possível.


A história do atendimento pré-hospitalar mostra a transição de ações pontuais para uma potente instituição do SUS, com um arcabouço legal que busca garantir a assistência humanizada e resolutiva a milhões de brasileiros em momentos de maior vulnerabilidade.


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